LOCOMOÇÃO

Realizado em parceria com universidade alemã, estudo busca identificar mudanças de hábitos dos usuários de transporte durante a pandemia

Resultados podem contribuir na adoção de políticas de mobilidade no contexto de crise sanitária. Foto: Isac Nébrega/Fotos públicas

 

A pandemia do novo coronavírus modificou radicalmente todos os aspectos da nossa sociedade, e não foi diferente com a mobilidade urbana. Para compreender de que forma a crise sanitária tem impactado no comportamento da população quanto à sua locomoção, a Universidade de Brasília integra pesquisa internacional, promovida em parceria com a Universidade Técnica de Dresden (Alemanha), que busca detectar as mudanças nos hábitos dos usuários de transporte. 

 

O estudo está sendo realizado em diversos países, sendo aplicado no Brasil e na América Latina pelo Grupo de Pesquisa Comportamento em Transportes e Novas Tecnologias do Programa de Pós-Graduação em Transportes (PPGT/UnB), coordenado pelo professor Pastor Willy Gonzales Taco, da Faculdade de Tecnologia (FT). Também fazem parte do grupo os pesquisadores Neantro Saavedra-Rivano, Fabiana de Arruda, Michelle Andrade, Fábio Zanchetta, Zuleide Feitosa e Ayomikun Aruwajoye.

 

É possível participar da pesquisa acessando um questionário público on-line, respondido em cerca de 20 minutos. Dividido em três partes, o levantamento traz perguntas sobre comportamento geral no tráfego, mudanças nas condições e rotinas de uso dos diferentes meios de transporte desde o início da crise de saúde pública da covid-19 e hábitos que serão adotados no deslocamento após a pandemia. O questionário estará disponível para preenchimento até meados de agosto.

 

O professor Pastor Gonzales afirma que os dados podem apontar mudanças nos meios de transporte da população em geral em decorrência da pandemia. "No período de isolamento social, as pessoas utilizaram pouco o transporte público e o automóvel, e algumas se deslocaram em áreas próximas a pé, utilizando bicicleta ou motocicleta, havendo maior uso desses transportes pelos trabalhadores de aplicativos para entrega de comida."

 

Também será possível estimar qual será o comportamento da população em relação à mobilidade urbana após a pandemia. "Se as pessoas efetivamente vão se deslocar, em curta distância, a pé ou de bicicleta; se em média distância vão utilizar o carro e a motocicleta; e se em longa distância vão usar o transporte público ou o automóvel: essa é a grande questão", esclarece o coordenador da pesquisa.

Coordenador da pesquisa, o professor Pastor Gonzales acredita que a pesquisa apontará mudanças na mobilidade urbana em função da pandemia. Foto: Júlio Minasi/Secom UnB

 

Os dados coletados no Brasil e na América Latina serão comparados com resultados da Europa, que possui informações mais consolidadas. Com isso, a expectativa dos pesquisadores é viabilizar, por meio do cruzamento dos dados, a implantação de modais de transporte ecologicamente corretos, como bicicletas elétricas. Para Pastor, os resultados podem subsidiar o poder público na adoção de políticas de mobilidade.

 

"Desde que foi promulgada a Lei de Mobilidade Urbana em 2012, foram estabelecidos prazos para que os municípios pudessem apresentar os seus planos de mobilidade. Mas, no decorrer do tempo, ocorreram várias prorrogações dessa obrigação estabelecida pelo governo", comenta o docente.

 

"A grande questão sobre a mobilidade urbana: ela será da forma como era antes da pandemia ou nós teremos um novo modelo de mobilidade urbana a ser implementado? Essa é uma pergunta que nós precisamos responder, porque isso nos possibilita propor políticas públicas que venham a potencializar essa lei", explica o professor.

 

PLANEJAMENTO DA MOBILIDADE – A pretensão é que os resultados sejam entregues à Comissão de Desenvolvimento Urbano e Regional da Câmara dos Deputados para discussão, mas também a outras instâncias. "Existem outras comissões tanto no Senado quanto na Câmara que podem usufruir desses resultados, a fim de fazer uma rediscussão e também uma readequação das diretrizes que vêm sendo implementadas antes da pandemia para o pós-pandemia. Isso é fundamental para que as políticas não acabem representando o que já passou. O que era antes da pandemia é uma coisa que dificilmente veremos se repetir", ressalta.

 

Pastor argumenta que os dados também podem auxiliar na gestão da mobilidade das cidades, com medidas como o escalonamento de horários dos usuários dos modos de transporte. "Dessa maneira, conseguiríamos direcionar melhor esses deslocamentos com o escalonamento de horários e, evidentemente, traríamos uma diminuição nos congestionamentos pelo uso do automóvel e do transporte público. Teríamos ônibus menos lotados, melhor oferta do transporte público e melhor atendimento para o deslocamento da população".

Pesquisa trará contribuições para o planejamento da mobilidade neste período e redução do uso do transporte individual. Foto: Antônio Valente/Agência RBS

 

Espera-se que a pesquisa aponte caminhos para a priorização do transporte coletivo em centros urbanos, de forma segura. O modal foi um dos mais afetados pela pandemia por aglomerar pessoas, que aumenta os riscos de transmissão da covid-19.

 

"Pelo o que observamos, infelizmente, se as medidas não forem tomadas de forma rápida e drástica, as pessoas vão acabar usando mais a motocicleta ou o automóvel para as médias e longas distâncias, o que pode levar à maior ocorrência de acidentes, congestionamentos, poluição e excesso de veículos. Isso porque o pilar da mobilidade urbana é o transporte público, que está passando por uma situação muito complicada em termos de manutenção, e das condições de operação", alerta Pastor.

 

O professor da FT aponta também a necessidade do Estado garantir a locomoção da população mais vulnerável, que depende unicamente do transporte público nas cidades, sem ter a opção de utilizar outros meios de deslocamento, como motocicleta, carro ou transporte por aplicativo.

 

"O público mais afetado é aquele que depende do transporte público e que não tem condição de migrar para outro modo. Infelizmente é uma situação que temos observado com recorrência e que precisamos trazer à luz para mostrar que a população precisa ser apoiada com políticas públicas, justamente porque são populações mais vulneráveis dentro desse processo da pandemia e pós-pandemia", finaliza.

 

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