ENTREVISTA

Deborah Santos, primeira gestora à frente da pasta, aponta desafios e caminhos para aplicação de política institucional voltada à temática

Deborah Silva Santos é professora do curso de Museologia e primeira secretária de Direitos Humanos da UnB. Intenção da SDH é realizar política colaborativa, com abertura para a participação da comunidade acadêmica. Imagem: Reprodução/UnBTV

 

Garantir a execução da Política de Direitos Humanos da Universidade de Brasília e promover ações que visem a promoção do respeito, da diversidade, da inclusão e do combate à violência, por meio do fortalecimento de uma cultura da paz. Estes são os pressupostos que norteiam a atuação da Secretaria de Direitos Humanos (SDH) da UnB, criada em junho deste ano como braço executivo das iniciativas debatidas na Câmara de Direitos Humanos (CDH). Escolhida para assumir a gestão da pasta, a professora Deborah Silva Santos, do curso de Museologia, já avalia como positiva a atuação do órgão nestes primeiros meses.

 

Em entrevista à UnBTV, Deborah fala sobre a incorporação da antiga Diretoria da Diversidade (DIV) à Secretaria, as atribuições da unidade e o investimento em medidas de inclusão e combate à discriminação na Universidade, além da articulação da SDH junto à comunidade acadêmica. Confira abaixo:

 

UnBTV: A gente tem hoje a Política de Direitos Humanos, que foi aprovada pelo Conselho Universitário em 2021, e também a Câmara de Direitos Humanos, inaugurada em maio deste ano. Qual a diferença entre eles e como eles se articulam com a Secretaria hoje?

 

Deborah Santos: A Política de Direitos Humanos começou a ser construída em 2018, com a criação de um Comitê de Direitos Humanos com vários grupos da própria Universidade. A intenção era poder pensar qual política a Universidade teria nesse sentido. Essa política foi aprovada no semestre passado e, depois, houve a necessidade de que esse comitê também existisse via Câmara de Direitos Humanos. Então, algumas das pessoas que faziam parte do comitê passaram a instituir a Câmara, de forma que apoiasse a política e que também estivesse ligada a um dos órgãos superiores da Universidade.

 

A intenção é que a Câmara seja um fórum permanente para discutir as políticas de direitos humanos e também quem vai debater as mudanças ou ampliações que devam ser desenvolvidas. A Secretaria de Direitos Humanos foi criada para ser esse braço da Câmara. Aprova-se uma política na Câmara, mas quem vai desenvolver e pôr em prática, vai ser a Secretaria de Direitos Humanos.

 

E por a Secretaria já existir dentro do Decanato de Assuntos Comunitários (DAC), como Diretoria da Diversidade, ela acabou assumindo a organização da DIV e está ligada diretamente ao Gabinete da Reitoria. As políticas da DIV que já aconteciam, irão continuar. Antes eram só quatro coordenações – Coordenação da Questão Negra, Condenação da Questão Indígena, Coordenação das Mulheres e Coordenação LGBTQIA+ –, e com [a transição para] Direitos Humanos, amplia-se toda a pauta da Secretaria.

 

UnBTV: A SDH está partindo da antiga Diretoria da Diversidade. Quais são as diferenças que a gente vai observar tanto na gestão, em questão de organograma e organização interna, quanto na função e atuação da DIV e da SDH dentro da Universidade?

 

Deborah Santos: A DIV [agora SDH] sai de dentro do Decanato de Assuntos Comunitários e fica diretamente ligada ao Gabinete da Reitoria, ao lado de outras secretarias, como a Secretaria de Comunicação (Secom), Secretaria de Administração Acadêmica (SAA). Então, é nesse organograma que está ligada a Secretaria de Direitos Humanos. E isso facilita um pouco essas conversas com outros setores da Universidade, pois, enquanto dentro do Decanato de Assuntos Comunitários é o decano quem mantém esse diálogo com outros setores, agora a Secretaria pode fazer essa conversa de forma direta.

 

UnBTV: Em 2021, o Conselho Universitário aprovou a Política de Direitos Humanos. O que hoje já foi realizado [dessa política]? Porque o propósito dela, em um primeiro momento, era fomentar o debate sobre como ter medidas mais inclusivas e também como combater atos discriminatórios dentro da Universidade.

 

Deborah Santos: Quem estava cumprindo antes a política era a DIV, e agora que ela veio para a Secretaria de Direitos Humanos, estamos só no começo. Faz quatro meses que a Secretaria foi criada, e estamos em um processo de reorganização da própria. Mas, o que temos percebido dentro da própria Universidade é que, com a criação da Secretaria, infelizmente temos recebido mais demandas, manifestações e denúncias sobre descumprimento dos direitos humanos em todas as áreas, desde assédio sexual, assédio moral, ao racismo e capacitismo.

 

Isso, na verdade, aumentou porque as pessoas começaram a perceber que teria um local que aglutinaria melhor esses assuntos. Fora isso, como estava ligada ao Decanato de Assuntos Comunitários, acho que havia um entendimento de que essa política era mais voltada para discentes e, na verdade, não é só isso. Além de a Universidade ser um setor educativo, também é um setor de trabalho. Esses atendimentos para servidores e docentes também têm sido gerados – eles têm aumentado e temos sido procurados.

 

Isso não quer dizer que tenham sido geradas mais denúncias. As pessoas têm nos procurado até pra saber como fazer, quais são os caminhos para que se formalize uma denúncia. A Universidade tem essa preocupação, e sempre a DIV fez esse papel – não é à toa que a Secretaria é criada com essas atribuições.

 

Por um lado, eu gostaria que não houvesse a necessidade de existir uma Secretaria de Direitos Humanos, mas a Universidade reflete o que tem a sociedade, e ainda somos uma sociedade violenta, uma sociedade que não está preocupada com a questão da cultura da paz.

 

UnBTV: Qual a contribuição a Secretaria de Direitos Humanos, em uma universidade na capital do país, pode dar para a formação das pessoas que passam por aqui – estudantes, professores ou servidores?

 
Deborah Santos: A intenção é que a gente crie dentro da Universidade um pouco desse pensamento e dessa cultura [de paz], porque ainda não estão em todos os lugares. O papel da Universidade é formar não só profissionais, mas também formar cidadãos e cidadãs plenos de direitos e que saibam reivindicar uma cultura de paz, uma cultura sem violência. Esse é o grande papel que tem a Secretaria. Se a gente conseguir daqui a um ano incutir na Universidade inteira uma preocupação sobre essa questão, já é um papel que a Secretaria terá cumprido.

 

Temos que conseguir fazer primeiro uma divulgação de que a Universidade hoje tem uma Política de Direitos Humanos e que ela está olhando para isso e para os casos de violação – e que as pessoas saibam disso. E, a partir daí, fazer com que as unidades acadêmicas e os decanatos comecem a pensar atividades que possam ser feitas nesse sentido. Não só disciplinas, mas outras atividades que tragam essa discussão.

 

Os casos de violação ainda são muito sérios e entristecem a comunidade, a direção da Universidade e os setores superiores. É essa a preocupação que a gente tem. Se as pessoas começarem a pensar que as ações feitas em suas práticas diárias às vezes são práticas agressivas e violentas, já será um grande passo que a Universidade terá dado.

 

A Universidade foi criada em cima dessa preocupação, mas também foi pensada em cima dessa construção de inclusão e de refletir sobre os problemas brasileiros, e isso mais do que nunca é um desses problemas. Não dá para a gente pensar numa sociedade democrática se não tivermos discussões sobre direitos humanos ou estivermos preocupados com a questão do sexismo, do racismo, do combate ao capacitismo, além da própria discriminação e assédio aos LGBTQIA+. Se a gente não conseguir construir uma sociedade assim, não tem saída.

 

UnBTV: Tivemos a primeira reunião presencial da Câmara de Direitos Humanos agora em setembro. Uma das principais pautas levantadas foi a do banheiro sem gênero. Como está o andamento dessa discussão hoje?

 

Deborah Santos: Essa não é uma discussão criada pela Secretaria. Na verdade, é uma discussão que a própria Universidade já vem fazendo há um bom tempo. Em resumo, tem sido uma reivindicação de criação de uma terceira opção de banheiros dentro da Universidade. Além da continuação dos banheiros masculinos e femininos, teríamos uma outra opção, que seria o banheiro agênero – ou sem gênero. Esta será uma opção para as pessoas LGBTQIA+ que se sentem mal em usar ou o banheiro masculino ou o banheiro feminino.

 

Levar para a Câmara essa discussão para aprovação é cumprir um pouco do que a Política de Direitos Humanos da Universidade tem dentro da sua definição – são as questões de combater todas essas discriminações e impedir que as pessoas passem por casos violentos. Hoje, o que tem acontecido primeiro é a criação de um grupo envolvendo representantes das mulheres, dos LGBTQIA+, pois sabemos que isso envolve outras violências e para que isso seja pensado de forma que as unidades acadêmicas, ou os setores que acharem necessário investir em criar essa terceira opção, discutam e vejam quais são os melhores lugares onde os banheiros devem estar localizados.

 

A gente já tem uma proposta de criar um banheiro no ICC, mas, ainda estamos em definição do processo, que envolve a infraestrutura, envolve a comunicação. Seria construído no ICC Sul, bem ao lado da Secretaria. Mas não é só esse local. Já temos na Universidade alguns espaços: no [Centro de Excelência em] Turismo, que tem um banheiro criado pela demanda da própria comunidade, e no Instituto de Artes (IdA), mas agora a gente quer que seja uma política de toda a Universidade. 

 

Essa é a primeira ação de grande porte que a Secretaria, junto com a Câmara, está fazendo, pensando na Política de Direitos Humanos. Tem várias outras ações que serão discutidas na SDH. Então esse é um um exemplo de qual vai ser o papel da Secretaria dentro dessa discussão dos direitos humanos.

 

UnBTV: Qual vai ser a articulação que a SDH vai ter com movimentos já existentes dentro da Universidade de direitos humanos por parte dos estudantes, seja de ensino, pesquisa, extensão, e dos próprios professores?

 

Deborah Santos: Bom, primeiro, essa articulação é mais do que nunca necessária e bem-vinda. Não queremos colocar esses grupos à parte. Na verdade, estamos abrindo [as portas] para a vinda de todos esses grupos, principalmente por estarmos dentro de uma universidade, então nada melhor do que trabalharmos com pessoas que discutam esses temas – os professores e os pesquisadores. Na verdade, a intenção também é criar uma rede. Quando pensamos em discutir direitos humanos, também podemos descobrir quem são os nossos parceiros nas várias unidades acadêmicas que possam nos ajudar a fazer uma discussão mais premente nos lugares em que tenham acontecido casos necessários de a Secretaria discutir. A gente quer ter essa rede e essa ajuda desses professores.

 

Quando a gente vai pensar sobre mulheres, a gente vai atrás dos grupos e dos profissionais que fazem trabalhos nesse sentido. Hoje estamos fazendo um levantamento pela Coordenação das Mulheres (Codim) para buscar quem são as pesquisadoras, os grupos e as professoras que trabalham e que têm trabalhos desenvolvidos sobre as questões das mulheres – sobre as mulheres negras, mulheres trans ou não. Se já temos pessoas discutindo sobre isso, então nada melhor do que pensar políticas nesse sentido e juntamente com esses grupos.

 

Sobre a questão dos banheiros, é isso que os grupos têm feito. Serão criados os banheiros, mas nada melhor do que discutir com esses grupos, são eles que sentem a discriminação e sabem quais são os locais melhores e necessários para que se construa a terceira opção de banheiros.

 

Nada melhor do que pensar dentro da Universidade utilizando a própria expertise que temos aqui dentro. A Universidade reflete tudo que tem na sociedade, e todos esses grupos e demandas que os direitos humanos atendem têm representantes dentro da UnB. A intenção da criação da Secretaria pela gestão superior foi essa, de termos essa preocupação, buscarmos o atendimento a esses grupos e fazermos parcerias com eles.

 

UnBTV: Onde fica a sede da Secretaria dentro da Universidade?

Deborah Santos: Para quem quiser visitar a Secretaria de Direitos Humanos, ela fica no ICC Sul, bem ao lado da Caixa Econômica Federal, na terceira porta. Estamos ali onde já funcionou o DAC e a DIV. Nós continuamos nesse espaço de braços abertos para fazer acolhimento ou simplesmente receber uma visita.

 

Confira a entrevista feita pela UnBTV:

 

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