A Universidade de Brasília celebra, ao longo de novembro, o mês da consciência negra. O período se dá em referência à data de 20 de novembro, escolhida simbolicamente por ser o dia de morte de Zumbi, líder do Quilombo Palmares. Na atualidade, a data é ponto de partida para entendimentos que vão muito além do papel do mais famoso quilombo do país. Localizado na região da Serra da Barriga, em Alagoas, Palmares entrou para a história como símbolo de resistência e evoca questionamentos sobre a existência e a necessidade de aquilombamento moderno, identificado, por exemplo, na negativa de direitos a pessoas negras e o negacionismo, que fecha os olhos para a realidade racista brasileira. Além das ações do Novembro Negro, a UnB formou, neste mês, a primeira turma do Curso de Formação de Avaliadores para composição das Bancas de Heteroidentificação.
Na UnB, as ações no Novembro Negro são organizadas pela Coordenação da Questão Negra da Diretoria da Diversidade (Coquen/DIV/DAC), em parceria com outras unidades articuladoras. Os esforços de pensar um mês temático objetivam preparar propostas de reflexão sobre a sociedade e o racismo estrutural, de forma que extrapole as atividades da data celebrativa. Para tanto, a Coordenação se articulou com diversos outros atores dentro da Universidade, como a Associação de Estudantes Africanos; o Grupo de Estudo e Pesquisa em Políticas Públicas, História, Educação das Relações Raciais e de Gênero (Geppergh), do Núcleo de Estudos Afro Brasileiros (Neab/Ceam - também parceiro); o Decanato de Assuntos Comunitários (DAC); a Biblioteca Central (BCE); o Centro de Estudos Avançados Multidisciplinares (Ceam); e o Centro de Convivência Negra, por meio do programa Afroatitude; além de parceiros externos.
"Não dá para lutar contra o racismo, que é estrutural e estruturante da sociedade, de forma individualizada ou institucionalizada, tão somente. Temos de coletivizar", explica a diretora da Diversidade, Susana Xavier. Para ela, é essencial que as ações sejam articuladas com os segmentos da comunidade universitária, outros órgãos externos e coletivos, para que o trabalho seja visibilizado e seja alcançado um ponto de consenso que possa disputar as narrativas postas. "Há uma disputa de narrativa na sociedade e é preciso nos organizarmos de forma coletiva para que possamos disputar o consenso. A sociedade só entenderá a doença do racismo quando aceitar que é racista", diz.
PROGRAMAÇÃO – Ao longo de novembro, as ações coordenadas pela Coquen têm se desdobrado em várias esferas: discussões, apresentações, exibição de filmes e lançamentos de livros foram apenas algumas das atividades que já aconteceram. A programação continua e será encerrada em dezembro, com uma apreciação coletiva em que os participantes terão a chance de manifestar sobre a experiência, de forma que a mobilização prossiga após o ciclo do Novembro Negro.
>> Confira a programação dos próximos dias do Novembro Negro na UnB
"Esse momento também deve abrir a perspectiva para os próximos eventos, de maneira que possamos buscar formas de promover a discussão dentro da temática étnico-racial e maneiras para avançar com a representatividade em ações de integração em todos os níveis", afirma o coordenador da Questão Negra, Manoel Neres. Na avaliação do coordenador, o Novembro Negro é sempre um momento de maior engajamento e é essencial aproveitar a oportunidade para ampliar as discussões. "Temos enviado convites para os coletivos e feito reuniões temáticas, algumas focadas inclusive no afroempreendedorismo", diz, em referência a uma das atividades da programação, organizada em parceria com a Associação de Estudantes Africanos (AEA). A ação discutiu perspectivas de mercado de trabalho para estudantes africanos e negros no Brasil.
Ulrich Koffi, graduado em Engenharia Mecatrônica pela Universidade e um dos representantes da AEA, acredita que a organização sintonizada com parceiros foi fundamental para fazer do evento um sucesso. "Conseguimos ter bastante interação do público, inclusive fora do Brasil, o que demonstra real interesse no tema", afirma.
Na mesma linha, o coordenador Manoel Neres avalia que a realização virtual do Novembro Negro, em respeito às recomendações de distanciamento social decorrentes da pandemia de covid-19, trouxe a possibilidade de conexão com atores de outros estados, além da disponibilização das atividades gravadas e transmitidas, podendo ser acessadas a qualquer tempo.
CONSTRUÇÃO COLETIVA – Uma das atividades que melhor sintetiza a preocupação da Universidade em envolver diversos atores na promoção de uma sociedade consciente e justa é o lançamento da revista Ori, previsto para a próxima segunda (30), às 17h, com transmissão pelo canal da UnBTV pelo YouTube. A publicação é uma iniciativa dos estudantes do programa Afroatitude, ligado ao Centro de Convivência Negra (CCN/UnB) em parceria com estudantes do projeto 365 dias de Consciência Negra do Centro Educacional 310 de Santa Maria (CED 310). O Afro vai às escolas, um braço do Afroatitude, conta com estudantes que levam suas experiências como pessoas negras a estudantes de ensino médio, ajudando a aproximar a realidade universitária de estudantes de periferia.
"Esse e outros trabalhos do projeto 365 Dias de Consciência Negra quebram paradigmas e mostram que esses estudantes podem sim entrar na Universidade. É como se fosse um sonho que pudesse ser a sua realidade", explica a idealizadora do projeto, professora Margareth Alves. Três alunas de Margareth participaram do projeto da revista Ori, que é voltada para o reconhecimento de personalidades negras inspiradoras. "Entrevistei uma pessoa que me inspira no dia a dia e pude colocar essa experiência nas minhas palavras. Foi importante para mim", conta a estudante do terceiro ano do CED 310 Laurikeicy Silva. Para ela, o envolvimento nos dois projetos fez com que aprendesse a se expressar e passasse a ter consciência racial. "Depois que desenvolvemos consciência, fica impossível não ver o racismo estrutural e que faltam negros nos espaços de destaque", opina a estudante, que também faz curso técnico em enfermagem e pretende cursar Enfermagem na UnB.
Everaudo Lacerda, estudante do 4º semestre de licenciatura em História, faz parte do time de estudantes que teve a iniciativa de trazer para a Ori os personagens inspiradores do dia a dia. "Essas pessoas negras falam sobre os desafios e conquistas. É importante que a gente, enquanto negro, se reconheça enquanto lutador na nossa própria capacidade de ser referência para outros que muitas vezes se espelham em nós sem sabermos", conta. A ideia é que, após o lançamento no dia 30, a revista siga sendo editada, ao longo do ano, pela parceria.
PRIMEIRA TURMA – Além das ações capitaneadas pela Coquen, a Universidade concluiu, em 17 de novembro, a formação da primeira turma de avaliadores das bancas de heteroidentificação. Iniciativa da Comissão de Acompanhamento de Políticas de Ações Afirmativas na Pós-Graduação (Capaa), a finalização do curso irá viabilizar a aplicação das ações afirmativas na pós-graduação e demonstra a transversalidade e coerência da Universidade na promoção de políticas duradouras de promoção da igualdade.
"Ao fazermos esse curso, também qualificamos o debate e a defesa da política adotada pela própria Universidade", esclarece Renísia G. Filice, coordenadora do curso e do Geppergh e também membra da Capaa. Para ela, além da formação dos avaliadores, o curso tem o potencial de combater o racismo ao reafirmar a política adotada pelo compromisso da UnB com uma sociedade mais justa.
"Foi um processo de aprendizagem que mudou a forma como enxergo todas as coisas ultimamente. Serviu também como parte do meu processo de autoconhecimento", opina a estudante do segundo semestre de veterinária e aluna da primeira turma do curso, Wendy Lis.
As colegas de curso, as professoras Maria Hosana Conceição, da Faculdade UnB Ceilândia (FCE), e Mariana Mastrella-de-Andrade, do Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução (LET), acreditam que o conteúdo apresentado permitiu conhecerem mais sobre o racismo estrutural. O aprendizado pode ajudá-las a ter embasamento nas ações como avaliadoras e no dia a dia.
"O racismo não é algo apenas individual, é social. Então a luta antirracista também precisa ser. Um curso como esse faz muito sentido para manter o trabalho coletivo que já existe dentro da UnB", afirma Mariana. Ela acredita que ser parte das bancas de heteroidentiticação é uma oportunidade para contribuir em um projeto antirracista.
O ambiente do curso também foi um diferencial para Maria Hosana. "Desde o início percebi que estávamos em um contexto de riqueza humana e que nosso aprendizado seria excepcional." Para ela, a iniciativa da Universidade em dar continuidade às políticas já definidas para a graduação são coerentes com a função universalizadora da instituição de oferecer oportunidades sem distinção de raça e cor, em direção à construção da igualdade.
É PRECISO INSISTIR EM EDUCAR – A importância de ações coletivas e coordenadas pela promoção da conscientização da sociedade se prova cada dia mais essencial. O Projeto Geoafro promoveu na noite da última terça-feira (24) a exibição, seguida de debate, do documentário Servidão, do cineasta Renato Barbieri. A ação faz parte do ciclo de webinários promovidos pelo projeto. A atividade, com tema O Brasil Africano e o Estado Escravocrata na Democracia incompleta, foi brevemente interrompida pela ação de jovens que se declararam racistas. Os responsáveis pelo evento se reorganizaram rapidamente e seguiram com a programação original. "Essa ação mostra que estamos incomodando e que precisamos seguir em frente ocupando os espaços que ajudarão a promover um projeto de nação no qual o Brasil Africano seja mais justo e consciente", disse o professor Rafael Sanzio, coordenador da atividade.
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