Nem sempre é fácil encontrar o acompanhamento nutricional que atenda a todas as demandas e expectativas do paciente. Nutrição esportiva de atletas com deficiência é um nicho ainda mais específico. Graças ao UnaAtleta, projeto de extensão do Departamento de Nutrição (NUT) da Universidade de Brasília (UnB), estudantes de graduação podem vivenciar a teoria aprendida em sala de aula a partir de práticas neste segmento, e os paratletas de ponta encontram auxílio para melhorar o rendimento.
“Nosso primeiro objetivo é proporcionar essa formação, para que os nutricionistas que passam por aqui possam efetivamente, mais a frente, assistir esse público. O outro intuito é o de prestar essa assistência, pois muitos dos nossos atletas relataram que têm muita dificuldade de conseguir um profissional apto para atendê-los”, explica a professora Teresa Helena Macedo da Costa, coordenadora do projeto.
Criado em 2009, o UnaAtleta já auxiliou mais de 30 paratletas ao longo dos últimos 14 anos. O projeto integra o Núcleo de Tecnologia Assistiva, Acessibilidade e Inovação (NTAAI) e a Plataforma de Inovação Bem-Te-Vi, que presta serviços focados no bem-estar, por meio de tecnologias, a pessoas com deficiência.
Atualmente, o projeto da UnB atende 16 atletas da seleção brasileira de rúgbi em cadeira de rodas e outros 18 de modalidades individuais diversas. Durante o acompanhamento, eles passam por anamnese (entrevista com paciente para diagnóstico de determinada condição); são submetidos à investigação sobre o conteúdo calórico e de nutrientes ingeridos nas 24 horas anteriores à consulta; têm dados como peso, altura, índice de massa corpórea e percentual de gordura coletados para análise do estado nutricional; e ainda recebem uma prescrição dietética.
O trabalho de auxílio nutricional adequado se consolida com o ganho de performance e a conquista de pódios em provas nacionais e internacionais pelos atletas. “Eu conheci o projeto por meio de um treinador que faz parte da seleção paralímpica e me apresentou o trabalho de nutrição do UnaAtleta”, relata o paraciclista Carlos Alberto Gomes. “Sem dúvida, os últimos três anos dentro do projeto foram os que eu mais tive resultados, com a melhoria do ganho de performance e recuperação”, afirma.
Morador de Alexânia, em Goiás, ele conta que nunca tinha recebido acompanhamento nutricional esportivo. Hoje, além de receber atendimento on-line, sempre que necessário, ele percorre os cerca de 80 km entre onde mora e a sede do projeto, no Departamento de Nutrição do campus Darcy Ribeiro, para tirar as medidas, percentual de gordura e ver como está a evolução do corpo.
“A alimentação mudou bastante a minha performance no alto rendimento do ciclismo. Aprendi muita coisa sobre pré e pós-prova, coisas que eu nem imaginava que poderia me fazer render mais no esporte”, comenta.
Diagnosticado com poliomielite aos seis anos de idade, o que causou a deficiência nos membros inferiores, Carlos afirma que iniciou no esporte tarde, aos 20 anos. "No início era um hobby. Quatro anos depois, entrei para o esporte adaptado e, a partir daí, passei a ser profissional”, conta, orgulhoso de sua trajetória.
Entre as conquistas, ele ganhou quatro medalhas em Copas do Mundo de Paraciclismo, bronze no Campeonato Mundial de Paraciclismo, além de ter participado dos Jogos Paralímpicos de Tóquio. O trabalho que une Universidade e esporte pode gerar ainda mais resultados no próximo ciclo olímpico.
“Em 2022, fiz um bom ano. Esse ano, estou focado em adquirir mais pontos para o Brasil, para em 2024 fazer uma ótima Paralimpíada”, diz o atleta, sem esconder a empolgação com a possibilidade de alcançar um lugar no pódio nos Jogos Paralímpicos de Paris.
ESPORTE SALVA – Outra atleta atendida pelo projeto, há cinco anos, é Ana Paula Marques, campeã mundial de vela adaptada e medalha de ouro no Campeonato Brasileiro de Halterofilismo de sua categoria, em 2022. Há dez anos, ela quase morreu vítima de feminicídio em Alvorada, no Rio Grande do Sul.
“Eu tinha 20 anos e um filho de três anos. Meu companheiro não aceitou a nossa separação e me deu dois tiros. Um deles acertou minhas costas”, conta. Após ficar paraplégica, a gaúcha fazia reabilitação no hospital Sarah Kubitschek. A convite de um amigo, atleta paralímpico, mudou-se para Brasília e entrou para o esporte, em 2014.
“A vela mudou a minha vida. Na hora em que me sento no barco, a deficiência some”, explica. Além de velejadora, Ana Paula pratica o halterofilismo, esporte paralímpico. “Para correr regatas de duas horas, preciso de um bom condicionamento físico, e isso o levantamento de pesos e halteres me dá. Desde 2015, concilio os dois esportes”.
Como halterofilista, Ana também vem disputando uma vaga para os próximos Jogos Paralímpicos. “Como gasto bastante energia e tenho que manter o peso da categoria no halterofilismo, a alimentação deve estar sempre bem ajustada. Nesse sentido, o acompanhamento nutricional na UnB vai continuar me ajudando a alcançar o melhor desempenho nos dois esportes”, explica.
CAPACITAÇÃO – A equipe do projeto é pequena: além da coordenadora, apenas três extensionistas, um estagiário e uma nutricionista fazem todo o trabalho de acompanhamento junto aos atletas. Mas, de forma unânime, os integrantes afirmam que a participação no UnaAtleta é uma grande oportunidade de aprendizado e crescimento profissional.
“Além do atendimento, fazemos muitas leituras de livros, pesquisas e apresentações de artigos. Também aprendemos como lidar com as diversas dificuldades e demandas de cada paciente”, conta Daiane Sales, estudante de Nutrição e extensionista.
“Tive a oportunidade de fazer o estágio complementar nessa área de nutrição esportiva e, depois, de ser extensionista. Tem sido muito importante porque o contato com esse tema dentro do curso é limitado”, comenta a também graduanda na área e extensionista do UnaAtleta Keline Aguiar.
Outras duas vagas de extensão para o projeto estão em aberto e devem ser preenchidas neste semestre.
Confira apresentação da estrutura e das atividades do projeto:
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