“Cabelo para pentear, cabelo para enfeitar, para enrolar e trançar ou deixar como está. Pixaim, sim! Gosto dele bem assim”, diz um trecho do livro Meu crespo é de rainha, da escritora negra e ativista bell hooks, que traz uma reflexão sobre a importância dos cabelos para negros e negras. Com o mesmo propósito de valorizar e celebrar essa conexão, a trancista, ativista negra e pedagoga Layla Maryzandra, desenvolve a pesquisa acadêmica e de extensão universitária Tranças no Mapa.
Nascida no Quilombo da Liberdade, em São Luís, Maranhão, e criada nas periferias do Distrito Federal, a discente escolheu o Mestrado em Sustentabilidade junto a Povos e Territórios Tradicionais (Mespt), da Universidade de Brasília, para realizar seu projeto. “Eu tinha a necessidade de construir outros mundos possíveis para mim e para a minha comunidade. De pensar que não sou apenas resistência, mas agência. E mostrar o valor do saber que adquiri em casa, trançando”, conta a pesquisadora.
Para ela, as estéticas africana e afro-brasileira, onde a história das tranças estão, poderiam ser fios condutores para se pensar diferentes caminhos para o desenvolvimento de uma sociedade mais justa no presente. Por isso, ela propõe na pesquisa a construção de uma história da diáspora africana, a partir dessa perspectiva das periferias da capital brasileira.
“O mestrado da Layla é inovador porque propõe um duplo sentido. Primeiro o de repensar a historiografia do DF, considerando a presença e o protagonismo das pessoas negras. Depois, contribui do ponto de vista do patrimônio e dos debates de história, ajudando a qualificar como um ofício o trabalho das trancistas”, destaca a orientadora da Tranças no Mapa e coordenadora do Mespt, Cristiane Portela.
“Dentro desse grande trabalho, remonto também narrativas das tranças enquanto mapas de fuga de africanos escravizados em San Basílio, na Colômbia; das tranças como esconderijos de pedras preciosas e de sementes no Suriname”, explica Layla. “Também há a intenção de salvaguardar os modos de fazer de trancistas negras, discutir identidade e território, direito à memória negra e especialmente apontar ações e políticas públicas”, relata a mestranda.
PESQUISA – Utilizando metodologias de cartografia social, mapeamento participativo, educação popular e história oral, a pesquisa é dividida em três etapas: mapeamento digital, que começou em abril, segue até agosto, e já conta com o registro de mais de 50 trancistas negras de DF e Entorno; oficina de mapa afetivo (presencial) e patrimônio cultural afro-brasileiro (on-line); e apontamentos de direito à memória e políticas públicas para o Estado, voltado para trancistas negras.
Cada etapa da pesquisa compõe objetivos específicos que terão perspectivas locais e nacionais. O mapeamento pode ser respondido por trancistas negras maiores de 18 anos, por meio de formulário on-line da plataforma de crowdsourcing e mapeamento Ushahidi, instrumento que auxilia comunidades a transformar informações em ação.
“Historicamente existiram diferentes caminhos epistemológicos para compreender e aprender sobre nossas origens africanas, a maneira que escolhi foi por meio das tranças. A relevância e inovação da pesquisa está em utilizar a cultura digital a serviço da ancestralidade, fazendo uso do campo digital para gerar conhecimento, pesquisa e formação nas comunidades e no campo científico”, detalha Layla.
Assim, ela propõe a construção da primeira cartografia sociocultural de trancistas negras no Distrito Federal e Entorno, que por sua vez está dentro das ações do Fios da Ancestralidade.
Este outro projeto da mestranda atua há 12 anos junto a comunidades, organizações e escolas, apresentando a estética dos tecidos e penteados tradicionais africanos como bens culturais, na perspectiva do direito à memória social e cultural. Layla estará na Semana da África 2023, de 21 a 26 de maio.
O Tranças no Mapa também é um projeto de pesquisa cultural, que conta com recursos do Fundo de Apoio à Cultura (FAC) do Distrito Federal, aprovado na linha Patrimônio Material e Imaterial no edital da Secretaria de Cultura de 2022, para execução em 2023, período da pesquisa de campo, que engloba as oficinas da segunda fase do projeto.
“Nosso legado é mostrar para sociedade que mulheres negras trancistas são agentes culturais e fazem parte de sujeitos coletivos que também devem ter direitos específicos, não apenas como profissionalização, mas especialmente como mestras de saberes tradicionais”, ressalta, entusiasmada, a estudante.
Além de inovador, o projeto está ligado à sustentabilidade social, uma vez que permeia aspectos de melhoria da qualidade de vida e diminuição das desigualdades raciais e sociais, ao valorizar os saberes e práticas de comunidades tradicionais. Também contribui para ampliar direitos e garantias de acesso aos serviços que visam possibilitar às trancistas negras acesso pleno à cidadania.
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