Simone Lacorte, 45 anos, teve seu primeiro encontro com a música ainda adolescente. Liliana Oliveira, 36 anos, deixou o emprego de arquiteta para se dedicar à ilustração. Camila Louise, 35 anos, viu na pintura em aquarela uma aliada no tratamento da depressão pós-parto. Renata Rinaldi, 33 anos, por sua vez, desde pequena soube que iria trabalhar com desenho. Além da ligação com a Universidade de Brasília (UnB), as quatro mulheres compartilham algo em comum: independente do momento da vida, elas trilharam caminhos no universo da arte, e seus trabalhos ganham cada vez mais destaque na UnB.
Nesta matéria, que integra série produzida pela Secretaria de Comunicação (Secom/UnB) neste mês de março como parte das iniciativas em homenagem à atuação das mulheres na Universidade, conheça histórias sobre o protagonismo feminino no campo artístico.
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Simone Lacorte é professora do Departamento de Música da UnB e integra a Orquestra de Violões de Brasília. Aos 12 anos, ingressou na Escola de Música de Brasília, onde posteriormente atuaria como professora entre 1999 e 2009, até tornar-se docente da UnB, em 2010. Aos 15 anos, começou a dar aulas particulares de violão e aos 16 passou a integrar a Orquestra de Violões, sendo a mais nova entre os músicos.
Hoje, a orquestra conta com 16 integrantes, sendo quatro mulheres. O grupo completou 30 anos em 2021, mas as comemorações tiveram que ser adiadas em razão da pandemia. As interpretações já renderam dois CDs, e o terceiro deverá ser lançado em breve, com ênfase em composições autorais de seus integrantes.
A professora conta que Brasília tem características muito específicas no campo da música, e uma delas é o predomínio dos homens entre violonistas. “Na formação do violão erudito aqui em Brasília preponderam os homens. Em outros estados é um pouco diferente”, explica a docente, que vem estudando o tema em sua pesquisa de doutorado no Programa de Pós-Graduação em História da UnB.
Entre suas referências de mulheres violonistas, Simone destaca o trabalho de instrumentistas brasileiras, como Maria Haro, Marcia Taborda, Cristina Tourinho, Flávia Domingues e Maria Rachel Tostes.
Apesar do cenário desigual, a professora avalia que avanços têm ocorrido, de maneira lenta e gradual: “Eu vejo o campo da arte de maneira muito positiva, eu acho que está melhorando cada vez mais neste sentido”, afirma.
MATERNIDADE – A servidora Camila Louise é formada em Jornalismo pela UnB e trabalha na Diretoria de Esportes e Assuntos Comunitários (Deac/DAC), na Coordenação de Arte e Cultura. Ela conta que sempre teve interesse por desenho e pintura, mas foi em 2018, com o nascimento da filha, que o hobby se transformou em processo de cura.
A servidora foi diagnosticada com depressão pós-parto, e resolveu aliar a arte ao tratamento terapêutico. Até então, Camila já havia feito aulas de desenho realista, mas só fazia uso de grafite. Foi quando ela sentiu a necessidade de “trazer cor” para suas produções.
“Eu sentia muita falta de produzir alguma coisa, de me expressar e principalmente de trazer cor para vida (pode parecer clichê, mas é real!). E isso foi crescendo, essa vontade de trazer cor”, relata a servidora.
Ela começou a fazer aulas on-line de pintura em aquarela e incluiu a técnica em seu repertório, que se caracteriza por obras com referências botânicas e animais. Além disso, tem feito cursos complementares para explorar a pintura a óleo – técnica com a qual ela gosta de trabalhar retratos.
A servidora conta que sua principal referência feminina na área é a pintora italiana Artemisia Gentileschi, que viveu no século XVII. “Ela traz para a pintura a perspectiva do que ela viveu, da mulher na sociedade. É um trabalho que tem me inspirado muito ultimamente”, afirma Camila, que divulga suas produções por meio de seu site.
ILUSTRAÇÃO – A habilidade com o desenho foi uma das razões que levaram Liliana Oliveira a optar pelo curso de Arquitetura e Urbanismo na UnB, no qual ela ingressou em 2004. Durante a graduação, ela chegou a fazer algumas ilustrações, e lembra que sua primeira referência feminina nesta área foi a brasiliense Luda Lima – que, com o tempo, somou-se a outras profissionais como Lari Arantes e Anna Charlie.
Depois de formada, Liliana começou a atuar profissionalmente como arquiteta, mas sentiu falta de atividades que estimulassem sua criatividade. Resolveu deixar o emprego para se dedicar aos trabalhos como ilustradora. Em 2020, voltou para a Universidade, desta vez para cursar Artes Visuais.
“Era uma coisa que eu sempre tinha sonhado e também sentia falta de ter mais qualificação nessa área. Além disso, achei que poderia ser uma boa ter uma formação mais voltada para o ensino de Artes”, afirma a estudante, que começou a oferecer cursos de aquarela on-line.
Liliana é idealizadora da marca Alegrias Ilustradas e presta diversos serviços na área, como produção de capas de livros, retratos e convites de casamento.
A ilustradora conta que a pandemia afetou seus planos de inaugurar um ateliê, e que precisou voltar a trabalhar em casa: “A pandemia quebrou a minha ‘bicicleta’ e tenho pensado em fazer outras coisas, porque não está sendo fácil”, lamenta. “A crise política e de saúde pública corroborada pelo governo tornou a vida dos artistas (e de todo mundo) mais difícil”, conclui Liliana.
QUADRINHOS – A mineira Renata Rinaldi vive em Brasília desde 2010. Em 2014, formou-se como bacharel em Artes Visuais pela UnB e atualmente cursa licenciatura. Em 2013, ela começou a trabalhar com quadrinhos e ilustração, publicados principalmente em zines. “Eu cresci sabendo que queria trabalhar com desenho, só não sabia como seria isso”, lembra a estudante.
Em 2017, Renata passou a trabalhar com mangás, o que a levou a ser classificada em várias edições do concurso internacional Silent Manga Audition (SMA), promovido pela editora Coamix INC, do Japão. Atualmente, ela também tem trabalhado com jogos (sejam eles digitais, de tabuleiro ou RPG). “À primeira vista pode parecer uma salada de frutas, mas as coisas têm conexão”, garante.
Entre suas principais referências estão quadrinistas e ilustradoras como a brasiliense Lorena Herrero, Cátia Ana, Lara Fuke, Karolyne Rocha e Camila Raposa.
A estudante de Artes Visuais conta que, apesar do grande número de artistas mulheres, ela observa que a maior parte dos selecionados em eventos de produtores de quadrinhos e de ilustração são homens.
“Eu fico me perguntando se é por falta de inscrição (acho que não, porque temos muitas mulheres produtoras e artistas) ou se é um enviesamento de quem seleciona. Porque é muito estranho observar essa disparidade nas seleções dos eventos”, analisa Renata.
DESAFIO – Seja no campo da música, pintura, ilustração ou dos quadrinhos, elas observam uma dificuldade em comum: a falta de autoconfiança entre as mulheres. “A gente sempre precisa mostrar além do que outras pessoas, a gente precisa sempre estar se desdobrando mais do que outros precisariam”, afirma Simone Lacorte.
Camila Louise identifica um sentimento de insuficiência que parece atingir mais as mulheres: “Elas sempre buscam se aperfeiçoar mais. Eu acho que isso está muito relacionado à condição de ser mulher na nossa sociedade”, avalia.
A estudante Liliana Oliveira, por sua vez, reconhece que a autoconfiança é um desafio: “Busco trabalhar isso em mim, mas as vezes é difícil”.
Renata Rinaldi avalia que a insegurança é um problema social que afeta mais as mulheres: “Eu acho que tem essa coisa sim, do tipo ‘eu preciso me profissionalizar três vezes mais do que qualquer homem’. Eu vejo que os homens não têm tanto essa dificuldade em se sentirem prontos como as mulheres, mas acho que isso é um problema social também. Nós, enquanto mulheres, somos educadas para sentir medo e insegurança em todos os espaços”, afirma a estudante. “A gente precisa descontruir isso na educação das meninas”, completa.
PLANOS – Após a conclusão da pesquisa de doutorado – prevista para agosto deste ano –, Simone Lacorte planeja trabalhar em um projeto com mulheres na Universidade. “Tanto com pesquisa quanto com cursos de extensão. Dar uma ativada em grupos de mulheres para contribuir não só na parte teórica da pesquisa, mas também com ações”, explica a docente.
Para ela, essas iniciativas devem trabalhar especialmente a questão da autoconfiança. “Esse é o principal ponto de todos. A gente tem que reconstruir essa autoconfiança, reavaliar e dizer ‘olha, isso que você faz é bom’. Eu acho que isso é muito importante e a Universidade tem espaço para essa discussão.”
Já a servidora Camila Louise conclui neste mês de março o mestrado em Educação na UnB, com uma pesquisa sobre as possibilidades de implementação de programas voltados para promoção de saúde mental e bem-estar na Universidade de Brasília.
“Um dos objetivos foi ver se existia interesse dos discentes por vivências que utilizassem recursos artísticos na mediação das atividades comunitárias”, explica a servidora. “E a gente percebeu que existe interesse, mas às vezes existem outras questões que dificultam a adesão.”
Grávida do segundo filho, Camila espera que a partir de sua experiência pessoal, aliada à pesquisa realizada, seja possível viabilizar outros recursos de promoção de saúde mental dentro da Universidade.
A estudante Liliana Oliveira pretende explorar novas frentes de trabalho que vêm sendo desenvolvidas no curso de Artes Visuais, por meio do projeto @agoraehlila. “Além de divulgar na internet, quero fazer uma exposição desse trabalho e buscar uma forma de torná-lo um livro”, planeja a estudante, que também gosta de escrever e desde 2019 está à frente do Poezines, iniciativa que mescla escrita e desenho.
Já Renata Rinaldi conta que pretende trabalhar cada vez mais na área de jogos, mas sem deixar de explorar novos espaços de formação: “Eu quero lecionar em escolas. A produção artística tem um viés educativo. Dentro da licenciatura, eu vi quão poderosa é a arte e suas linguagens para formação da sociedade e quero exercitar isso.”
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